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terra de espíritos

histórias, crônicas e contos

Aconchegante

Por: Antonio Mata

Podia ouvir o canto dos pássaros. Primeiro um pequeno punhado deles, depois a rua e então, o bairro inteiro. Nos condomínios, nas árvores de fundo de quintal, gostavam de iniciar o dia por volta das cinco horas. Com o sol a seguir, já estavam em ação. 

Havia o silêncio, o ambiente acolhedor, o escuro suave. De tão bom, decidiu ficar, quando então, se viu retirada dali, contra sua vontade. Uma força que não compreendia fez com que fosse sugada. O susto, a constatação e a decepção. Sentia-se como um feto, um bebê arrancado de sua mãe. 

A cantoria dos pássaros prosseguia naquela mangueira bem ao lado, no quintal do vizinho. Um despertador que acordava cedo, mas não tirava da cama. Eram os mesmos do dia anterior? Já não tinha certeza de quais seriam.

Desejava voltar, intimamente pedia para voltar, sonhava em voltar. Queria aquele lugar mais uma vez. As lembranças vagas a incomodavam, pois nunca lembrava direito. Somente aquela impressão de bem-estar. 

Noite alta, onde o sono pesado chegou. Dessa vez, nem a motocicleta sem descarga de algum perdido seria capaz de acordá-la. Não importava mais. Já não estava mais ali. 

Banhando as nuvens, o sol estava claro como dia. Suave e brilhante oferecia uma beleza a mais ao extenso tapete de nuvens a desfilar logo abaixo.

Andorinhas acima das nuvens, araras e curicas faziam revoada logo abaixo. Leve como uma pluma, levitação sem esforço. Pôde penetrar no aglomerado esbranquiçado e leitoso. A despeito da pouca visão, vislumbrava forma vivas. Mais que isso, identificava formas humanas. Entendeu que não estava sozinha.

Uma voz feminina quebrou o sussurro do vento. 

— E então, já viu o suficiente?

Depois de ligeiro susto, pois não via ninguém, pôde responder. 

- Ah, aqui é tão reconfortante. Como posso fazer para ficar, ou para vir mais vezes?

- Muito simples, faça tudo aquilo que um dia você concordou e enquanto chorava prometeu fazer. 

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