Foto: Wikimedia Commons
Por: Antonio Mata
Sentado com a cabeça tombada para o lado. Os olhos, de pálpebras baixas, pareciam olhar para o tempo, para o vento, para nada. Amargurado e mudo, apenas ali estava.
— Em que posso ajudá-lo?— O que o trás até nós?
— Balbucia algo, uma, duas três vezes.
— Você pode ser mais claro?— Não consigo entender. O que o aflige?
— Eu matei.
Se fez silêncio.
— O Concórdia, eu matei.
— O que foi que aconteceu?
— Fui ganancioso e apostei. Apostando, perdi tudo. Perdi o que era meu e o que era dos outros. Foi quando tudo se acabou. Era responsabilidade minha.
— Por que entende que era responsabilidade sua?
— Muito simples, eu era o comandante.
— Então o Concórdia era um barco?
— Sim, o Concórdia do Mato. O sonho de meu pai, o patrimônio de minha família.
Silencia um instante, e então prossegue.
— Uma tempestade muito forte, chovia muito forte. Muita ventania, o rio encapelado demais. Havia 40 passageiros no barco. Ganancioso, coloquei muita carga. Passou do máximo de carga, e eu apostei.
Para e chora, então prossegue.
— O banzeiro, muito alto, começou a jogar água para dentro do barco. Houve uma gritaria, desespero. A água continuou entrando.
Cabeça abaixada, para mais uma vez.
— Foi muito rápido, era noite, não tive tempo de encostar o barco. Quando correram para pegar os salva-vidas, os coletes, já era tarde. O Concórdia do Mato foi para o fundo muito depressa. Éramos 44 pessoas, em um recreio pequeno e muito cheio de carga. Morremos todos, no meio da noite, na escuridão, morremos todos.