Por: Antonio Mata
Pretejado, tomado de fungos, o casarão velho, de telhado tão esquecido quanto o resto. Camadas de fungo secados sob um sol inclemente. Os poucos moradores da construção abandonada, por preguiça ou necessidade, já não ligavam mais.
Escuro, fétido e quente, muito quente. Mas há quem goste. Ali bem perto, logo abaixo das telhas e do madeirame. A 55 graus, aproveitavam o conforto das 14 horas da tarde. Sair nem pensar. Lá fora, luz de furar os olhos.
— Vai querer sair? — Pergunta para o vizinho ao lado.
— Só depois das dezoito. Aqui tá melhor. Sair só para comer.
Agora são 60 graus.
— Está quente aqui, não é?
— Quente por quê? Está confortável.
— Aqui estará confortável quando resolverem esvaziar o lugar.
— Quem vai querer sair, você?
— Não, nem pretendo. Só precisa botar para fora quem só come e dorme o dia todo, agarrado, amontoado com os demais. Está tudo lotado. Aqui não cabe mais ninguém.
— Como vamos saber quem deve sair?
Um gritou.
— Os mais velhos. São os mais inúteis!
Outro discordou.
— Os mais novos, são eles que mais comem e só pensam em dormir, enchendo o lugar cada vez mais.
A discussão parecia tomar destino indefinido, até que o incomodado com a lotação fez uma proposta.
— Nada de brigar à toa. Sejamos justos nessa decisão. — Os demais aguardavam para saber qual seria sua sugestão.
— Todos vão sair para comer e depois vão descansar, como de costume. Porém, aquele que, durante o sono acabar caindo no chão, será mandado embora.
Ninguém reclamou e aparentemente pareciam ter gostado. Não fosse que as tais quedas eram bastante comuns, independente de idade. Bastaria um empurrão e logo haveria alguém a caminho do chão. Entretanto, foi posto em prática.
No meio da noite, alguns morcegos que haviam comido demais, relaxaram. Com o peso extra, acabaram caindo no chão.
Imediatamente começaram os assobios indicando aos gorduchos que deveriam ir embora. Isto se repetiria por vários dias. O lugar foi se tornando mais agradável com a diminuição da população.
— Devo dizer que você tinha razão. Agora está muito melhor.
— Só uma questão de lógica, meu amigo. Agora está confortável.
Todos ao redor concordaram. O critério adotado estava dando ótimos resultados.
Enfim, em meio a madrugada, ouviu-se o barulho típico de uma queda. Quando foram verificar de quem se tratava, encontraram o autor da medida que aumentaria o conforto do lugar.
— Acho que dormi demais. Nem senti quando caí.
Nisso, já estava rodeado de olhos por todos os lados. Esperavam que fizesse o que tinha que ser feito.
— Isso agora não interessa. Cumpra o combinado.
Vendo que seria inútil reagir, deixou o casarão confortável vitimado por suas próprias ideias.