Por: Antonio da Mata
Acomodou-se no alpendre de modo a acompanhar o raiar do dia. O negrume que escondia quase tudo, logo iria passar. Aos poucos, pôde ver que o horizonte enevoado, empalidecia.
Névoa, sombras, o barrento enevoado das águas e uns poucos telhados adiante. Uns poucos apareciam no silêncio, como ele. Só para olhar. Não se preocupava com outras coisas.
Veio à mente o passado recente, do que tenha feito e que já não muda mais. Onde agora tudo parecia tão rápido.
— Quanto tempo temos antes de voltarem aquelas ondas?
De pé observa as faixas de luz que se projetam sobre os poucos telhados, a água barrenta e a névoa que envolve quase tudo. Que vieram como gotas, em silêncio.
Sem esperar, sem que se soubesse do tempo, do dia seguinte. Teria saído dali, não teria? De pé no alpendre, já não faz diferença. As gotas em silêncio não fazem diferença. Se acumulou para passar, para varrer e destruir.
Derrubando homens entre outros animais. Devastando a sede, afogando esses campos, homens, cidades e tudo mais.
Por quanto tempo será? O vírus já passou, outro virá?
Derrubando árvores, abrigos, planos, pensamentos. Seguindo a linha. Do que foi escrito pelo mesmo lábio. De doença de tormenta, tão furioso.
Sente que aquilo é tudo temporário. Que já irá passar. O céu sem estrelas só fala das cinzas. Muito escurecido, só contará das chuvas, das ondas. Onde tudo passa e tudo vem.
E se teu amigo vento não te procurar, é porque outras águas ele achou de soprar. Outra vez funesto e indigente. Onde tudo irá arrastar. Já sabe que é assim. Poderá voltar e procurar. Então, senta e apenas assiste.
De que jeito for, vai chegar, vai passar. Já é dia.