Por: Antonio Mata
Sentia poder caminhar, muito embora olhasse para todos os lados, meio desconsertado. Como quem busca se localizar. Tudo bem que estivesse claro o suficiente para enxergar tudo.
Quer dizer, podia enxergar dezenas de quilômetros adiante. Assim, tinha definição de algumas formas, as quais não distinguia direito por mero desconhecimento.
Só queria mesmo definir o que era embaixo, em cima, direita, esquerda, para trás e para frente. Enfim, queria se localizar. Andar sobre o quê? Não tinha chão, mas andava.
Também não era só isso. É que sentia pressão debaixo de seus pés. Só não divisava chão algum. Além de um certo torpor, uma certa leveza que não compreendia.
Entendeu logo que não estava sozinho. Não se sentia mal por isso. Chegavam até ele e ficavam olhando curiosos. Ficavam curiosos da sua curiosidade. Talvez de sua própria confusão.
- Está procurando alguma coisa?
- Não sei.
- Quer procurar alguma coisa?
- Não sei.
- Quer fazer alguma coisa?
Olhou para cima, para baixo...
- Ainda não sei...
Com a mesma rapidez com que surgiram, começaram a se afastar.
- Não, espera, espera aí! Só uma coisa, uma coisa!
- Sim, diga, estamos aqui para responder. Mas, era você que não queria perguntar.
- Tá bom, entendi.
- Então pergunte.
Havia pelo menos meia dúzia deles aguardando para tirar suas dúvidas. Mesmo sem dizer nada. Apenas olhavam e o esperavam com grande curiosidade.
— Está bem, me digam uma coisa. Se eu seguir para aquele lado eu chego aonde?
— Ora, você chega lá. Lá daquele lado. — Virou-se e prontamente apontou para o lado indicado.
— E o que tem lá?
— É só ver o que tem aqui. O que tem aqui, tem lá também. É só isso que você queria perguntar?
— Como pode ser isso? Não existem lugares novos aqui?
— É claro que sim, tem muitos. Você não consegue ver? Não está enxergando direito? — Não era por gozação que dizia isso. Realmente queria saber se o visitante conseguia ver tudo.
— Pode me levar até lá? Fica muito longe?
— Aqui não tem nada longe. Me acompanhe e verá.
Iniciaram uma caminhada de alguns segundos e então sentiu-se transportado para mais além.
— Pronto, aqui estamos nós. Já chegamos onde você queria estar.
Parecia satisfeito com a caminhada extra rápida. Tornou a olhar ao redor na busca de algo que lhe ajudasse a se localizar. Encontrou modesta forma, algo como uma elevação de aspecto ligeiramente acinzentado. De resto a névoa suave de antes.
— Então é só isso? — Meio estupefato, perguntava por estar impressionado com a mesmice do lugar. Parecia tudo muito igual.
Já havia entendido que as comunicações eram todas mentais. Somente ele próprio, esquecia e principiava a falar.
— Como isso é possível? Como viver em um lugar que parece tão vazio? Não há nada que lhes impressione a visão?
Ante a sua indagação, o número de ouvintes aumentou. Como se muita gente ali por perto, tivesse entendido suas preocupações e aproximou-se querendo ajudá-lo.
Faziam movimentos na direção de algum lugar. Achou fantástico isso. Então haveria algum lugar de verdade. Algum lugar que não lhe passasse a sensação de vazio. Até que alguém falou.
— Não está vazio. É você que ainda não consegue ver. Venha conosco, isso poderá lhe fazer mais sentido.
Ato contínuo todos se deslocaram. Mais uma vez a movimentação rápida, feita em segundos. O grupo todo o acompanhou, queriam mostrar, queriam que visse.
Finalmente pôde ver.
Por todos os lados cores diversas. Formas sabidas, conhecidas, como se visões e antigas lembranças que trazia na memória estivessem naquele lugar, só que de uma forma mais completa.
Levitava por todas as partes verificando tudo. Quando assim o decidia, voltava a caminhar. A ideia do em cima, do embaixo, foi deixando de ser importante como era antes. Porém, podia ver tudo com enorme clareza.
As formações vegetais, as águas, os animais, o céu que mudava de cor quase o tempo todo. Prédios, palácios, habitações, das mais diversas. Desde as cabanas rudes das populações primevas, até as mais complexas e belas.
O pequeno cortejo de amigos o acompanhava. Sentiam-se satisfeitos em poder mostrar. Havia um quê de satisfação naquilo.
— Aqui é totalmente diferente. Onde nós estamos?
— Não se trata propriamente de um lugar no espaço. Aqui é onde tudo é estruturado. Preparado para o adensamento energético. Quando então adquire condição de adentrar os mundos mais densos da terceira dimensão.
— Então, daqui saem todas as coisas? Tudo o que há na Terra?
— Todas as coisas destinadas à terceira dimensão.
Assumiu um sorriso tolo, uma satisfação em saber que tal processo era possível. Ainda voltou a perguntar.
— Qual a condição para que se possa ter acesso a tais coisas?
— São algumas, bem correlatas e você as conhece. A sua necessidade, a sua experiência e o seu esforço em querer fazer. Se dá pela acumulação. Assim, por mais que o tempo passe, estará sempre aprendendo ou descobrindo alguma coisa.
Estava satisfeito com o que viu. Porém, faltava um detalhe.
— Entendi e estou maravilhado. Mas, e vocês? Além de quase não poder vê-los, apenas sinto suas presenças, o lugar onde vocês vivem parece não ter nada lá. Parece estar muito vazio.
— O vazio não existe. Já entendeu que você não enxerga tudo.
— Mas, com relação a todas as coisas aqui. E as suas necessidades?
— Você diz, materialmente. Aqui nós não temos nenhuma necessidade. Para nós isto é só o passado.