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terra de espíritos

histórias, crônicas e contos

Não tem espaço

                                                                             

                                                                                                                                                    Foto: Alicja

Por: Antonio Mata

Encolheu-se todo ante a pingadeira. A chuva chegou de repente e muitos começaram a correr para o mesmo lugar.

— Vão para outro lado, aqui já está cheio! Não deu para ver, não?

Gritava com aqueles que chegavam, enquanto todos se amontoavam cada vez mais.

Os cantos mais ao fundo e mais secos, já estavam ocupados, enquanto, na correria, o número só crescia. Foi num instante que os retardatários foram ficando expostos, recebendo respingos nas costas. Bastaria só mais um pouco de vento e os pintos molhados começariam a aparecer.

— Mas que costume mais sem noção, de ficar todo mundo amontoado! Desconjuro! — Prosseguia resmungando.

— Por que não vão para outros lugares, por que já não somem daqui? Insistia o resmungão.

— Vão atrás de um lugar grande, espaçoso. Aqui não presta mais. Vão tentar a sorte em outro canto do mundo!

Foi tanto barulho e tanto empenho naquele discurso, de quem tem anseios de dizer umas verdades à turba, que afinal chamou a atenção dos demais.

Logo ali, na frente de todos, a chuva se transformara em um grande aguaceiro, com todos se espremendo mais ainda.

Impaciente, se preparava para mais uma vez soltar as penas, quando, se deslocando do fundo, meia dúzia dentre os mais velhos e mais fortes, se aproximaram daquele moço reclamante para lhe oferecer alguns esclarecimentos.

— Então você está interessado em mais espaço, não é? Sendo assim vamos lhe oferecer a oportunidade de procurar por ele.

Às bicadas o jovem criador de caso foi posto para fora da borda protegida do telhado. Seu lugar já não era mais ali. Empurrado para a chuva, voou com as asas encharcadas em busca de abrigo. Encontrou em outra beirada de telhado.

Ao tentar pousar, foi logo avisado de que o local já estava lotado. Sem acolhida bateu as asas sob a chuva, divisando por sobre os telhados da cidade onde pudesse se abrigar.

Atento aos poleiros, improvisados por sobre condicionadores de ar e evaporadoras, balcões de janela que oferecessem alguma proteção, e toda sorte de buracos que pudessem aparecer. Sem sucesso naquele voo encharcado, e por isso mesmo curto, foi buscar abrigo sob as árvores, encontrando-as cheias de passarinhos, que a despeito do tamanho, brigavam ferozmente por cada galho protegido sobre a folhagem.

Todo molhado, pousou em uma calçada no meio da rua deserta. Sentiu-se mais exposto, inseguro e desprotegido no meio da metralhadora de pingos por todos os lados que se estalavam no chão.

Enxergou um arvoredo, sem folhas e com seus galhos finos sendo açoitados pelo vento frio. Decolou mais uma vez, agarrou-se em galho que pelo menos suportasse seu peso, e ali, encharcado naquela chuvarada, ao balanço do galho fino soprado pelo vento, o pobre pombo barulhento encontrou o seu lugar.

O lugar dos reclamantes, dos sempre insatisfeitos, que põem defeito em tudo, e que perturbam os demais com o seu mal humor e sua presença sombria. O lugar dos maledicentes, egoístas e falastrões, sempre reservado e à sua espera, porém longe dos demais. Tanto na fábula, quanto na vida.

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