Imagem: José E. Camargo, por Pixabay.
Por: Antonio Mata
Entulho, lixo, monturo. Entre escombros, escoras, tábuas, material calcinado e lama. Esta grudava em tudo. Os pés molhados, a comida molhada sempre buscada por ratos, o sono molhado. Homens, lama e entulho se misturavam.
Não demoraria muito para retomarem o canhoneio do setor. Tão logo este passasse, era só o trabalho de se fazer a contagem daqueles que permaneceram de pé.
Estrondos, gritos, ordens, alucinações sucessivas, tudo repetidamente. A demência não é um fenômeno físico. Assim, acompanha o seu portador, sobrevivendo à destruição corpórea. Ainda assim, tal e qual corpo despedaçado no canhoneio, junto sobrevém aquelas consciências despedaçadas.
Há um ponto onde não se sabe mais o que é realidade. Esta também prossegue, como que misturada por entre alucinações. Representações grosseiras produzidas pelo próprio ser.
Lapsos de relativo silêncio oferecem pequeno conforto. Então, pode ser verdadeiro. Desse modo, é melhor ficar ali mesmo. Até tudo passar, quando passar. A mente destruída sonha com este final. Deve haver um final.
Entrementes, o socorro já se apresenta.
— É um cenário bastante crítico. Dentre os casos mais graves observados aqui, teremos que selecionar os mais urgentes e com melhores chances de recuperação. Não há como esquecer que o retorno ao convívio das paisagens naturais, apoiado no fator tempo, não está disponível para todos. O retorno à proximidade com as coisas da Terra. O melhor dos remédios.
— Sim, teremos que fazê-lo e de modo muito criterioso, pois são pouquíssimas as vagas na Amazônia e seus terapêuticos e isolados cenários. É um lugar ótimo para se fazer isto. Além de se decidir quem vai ser recebido pelos índios e quem já pode ser recebido pelos caboclos, pela ribeira.
— Sem dúvida que as vagas para a experiência indígena são as mais preciosas. Receberão os mais doentes, até que possamos promovê-los, para mais perto da dita civilização.
— Bem, então assim seja. Esperemos que Clémence possa ter um bom proveito. Depois iremos até lá ver como estão se saindo estes novos indiozinhos. Os flagelados mentais da última loucura da Europa arrogante. Ou, o que sobrou da bucha de canhão.