Por: Antonio Mata
Talvez não se imaginasse que uma leve, mas intensa borrasca pudesse ter tantas implicações. Que tais conjugações na natureza pudessem ser tão comuns. Mas, também muito necessárias.
Não é borrasca de mar. É aquela que, sob certas circunstâncias, se manifesta nos lagos e até mesmo nos rios.
— Estou vendo que pretendes fazer um areal de uns 40 metros de fundo, não é? - Perguntava uma andorinha.
— Se quiser faço um de uns 50. Se preferir faço um de 60 metros de fundo. Se não for maior. — O vento, confiante em suas capacidades, procurava esclarecer as coisas.
— Agora ficou confiado. É muita coisa para se fazer.
— O que é pouco, o que é muito para quem dispõe do fator tempo? Isso não é nada. O tempo sempre esteve comigo. Posso soprar a pior tormenta por dias a fio. Se não houver água, sopro uma tempestade de poeira e areia.
— Contudo, ainda não vejo maior significado. Você não pode criar vida com seu sopro. Somente nós, espalhando sementes, ou mesmo as chuvas fazendo tudo germinar. Você não faz sequer uma touceira na beira do lago.
— É mesmo? Veja aquele areal. Pois lhe digo que posso transformá-lo. Não estaria esquecendo algo?
O vento se pôs a soprar. Primeiro lentamente, depois em maior intensidade. O vento principiou a soprar água por sobre o areal e as áreas próximas. Soprava, depois se detinha e soprava de novo.
A área foi mantida regularmente úmida. De modo que sementes e polens, trazidas pelo próprio vento, aliado ao trabalho dos pássaros na disseminação de outras sementes, acabaram por criar as condições necessárias para a germinação.
Então adquiriu um comportamento sazonal, soprando regular e intensamente em certas estações do ano. Trazia não somente polens e pequeninas sementes, como também poeira das terras adjacentes.
Aos poucos a vegetação na borda do areal começou a avançar na direção daquele descampado, por conta das fases sem vento. Aqui e ali tudo começou a germinar.
Primeiro as gramíneas e depois os arbustos começaram a surgir. Com o avanço dos anos a paisagem se transformou de uma forma tal que o areal acabou esquecido de tão coberto que ficou pela vegetação do lugar.
Ao rever a andorinha, o vento lhe perguntou.
— E então, há mais alguma coisa que eu possa fazer por você?
A andorinha, fazendo sobrevoos por sobre a nova vegetação, reconheceu o intenso trabalho realizado.
— Agora confio em você. Já não traz o ímpeto destruidor que nos contavam. Você também renova, remodela e transforma. Você conduz a água. Acredito que exista muita coisa para ser feita. Sugiro que de agora em diante combinemos nosso trabalho.
— Pois bem, então está combinado.
Foi dessa forma que, ampliando o trabalho dos ventos, das águas e dos pássaros e demais animais, o mundo prosseguiu em seu processo de transformação e renovação.
Espaços abandonados, terras desoladas e toda sorte de construções destruídas foram reduzidas a ruínas, tudo ao passar do tempo. Cidades inteiras foram soterradas. Os ventos empurravam as massas de ar dos oceanos para os continentes, ampliando enormemente o alcance.
A Terra convulsionava, massas continentais eram postas a descansar, enquanto outras emergiam das águas. Tudo era rapidamente tomado pela vegetação. O vento e os pássaros alcançavam as terras mais distantes.
Ao final predominava o que era de semente e a vida animal. As grandes florestas se multiplicaram. Acolheram centenas de milhares de espécies de animais. Do aparente caos se fez a ordem.
Os pássaros ganharam os céus em grandes revoadas e migrações. Pequenos grupos humanos viviam muito próximos da natureza e daquilo que ela lhes oferecia. A renovação da Terra de terceira dimensão havia se completado. O paraíso se definiu e a nova Morada estava pronta, mais uma vez.