Imagem: Jornal da Fronteira.
Por: Antonio Mata.
Calmamente afiava a ponta do caniço, sentado sobre uma pedra. Precisava obter um traço, o mais fino quanto possível. O traço era fino em uma ponta e rombudo na outra.
Sabia de antemão, que para alargar o traçado, bastaria calcar com ligeira força a argila ainda úmida. Esta, receberia pequena sequência meticulosa de traços e sinais feitos em cunha.
Normalmente, registros contábeis, de terras, animais e cestas de grãos. Passaria o dia às voltas com os tais registros. Tendo o cuidado de secá-las ao sol e guardar as tabuletas em uma caixa de madeira com tampa.
Deixava registrado os produtos do campo para seu rei, receoso de ser enganado. Logo, estaria utilizando a mesma escrita para contar episódios de valor do aprendizado dos homens.
O registro das estações; a posição dos astros; as cheias dos rios e sua posição, mas também suas histórias. Foi assim que chegou o lendário rei Gilgamesh. Em inscrições feitas em milhares de tabuletas de barro.
Um caniço em barro mole, de limitações por demais evidentes. Procedimento que não faria história, sendo apenas um ponto de partida, nos longínquos 6 mil anos passados.
Mesmo assim, o barro gravado, deixaria uma obra polêmica que gera controvérsias até hoje. Poderoso e contraditório, O Livro de Enki, fala de um tempo há muito perdido.
Um tempo em que dois mundos estavam ligados. Onde o homem era algo a ser desenvolvido, a partir de profundos conhecimentos genéticos. Um ser diferente e inteligente que teria estado aqui.
Entrementes, chegou ainda o filho do Altíssimo, e com Ele outra escrita.
A escrita era tudo e tudo que detivesse valor precisava ser escrito. Fez-se a era do papel. Este tornou-se analógico ou digital. Então, cruzou os 58 milhões de livros vendidos em um ano.
Nunca se escreveu tanto e nunca se leu tanto. A busca de uma história singular. Agora, capaz de conduzir ao sucesso, sonho de milhares que se apresentavam diante de suas telas.
Sem exagero algum, tudo já está dito, tudo já está escrito. Toda letra, palavra, verso ou canção. Das ideias as mais extravagantes, às ideias, as mais inteligentes.
Seis milênios de coisas para se registrar; apreciar; contar e descobrir. O tempo passou, a civilização moribunda passou e com ela, acabaram por escrever o seu tudo. Aquele que lhe cabia.
Contudo, faltou a verdade e a fraternidade, tão almejadas. Estas não vieram como se esperava. A escrita é apenas o registro.
Mais que escrever, anseia-se por um mundo, mais que novo, que seja verdadeiro. De ideias e sentimentos renovados. Algo que traga a motivação, a originalidade e a fraternidade, mais uma vez. A Paz na Terra.