Foto: Quino AL
Por: Antonio Mata
No início não parecia ser grande coisa, nada que exigisse maior atenção . Fosse o que fosse, o que aconteceu, é que consumiu suas forças no espaço de dois dias.
Tempo de poucos recursos, dificuldades muitas, tempo de fé, esperança e muito esforço. Tudo distante, demorado e impreciso. Há de se ter paciência, persistência e a coragem de se fazer.
Aquele negócio piorou logo.
Pegou seu casaco roto, colocou o garoto de pé, não sem esforço. Parecia distante dali, na cabeça baixa, da febre, da dor. Faltava descer os 25 metros da colina, até a rua logo abaixo, tudo na terra meio enlameada, pois havia chovido à tarde.
Noite fria de início de junho. Fazer agora os 300 metros até o ponto de ônibus. É só uma linha, vai chegar.
A jardineira de luzes amarelas percorre a estrada de terra, batendo, sacudindo e rangendo, em meio a muito barulho de motor, até encontrar o asfalto rumo ao centro mais próximo.
Descem no melhor ponto possível, segundo o motorista. Divide seu peso, ainda que meio magro, por cima daquela figurinha que insiste em carregá-lo até o hospital. Mais gente, mais espera, mais paciência, até o atendimento. O garoto cochila sentado no banco de madeira.
Recebe soro intravenoso, analgésico, antitérmico e vitaminas. Ainda, uma requisição de biopsia para um material coletado na garganta e posto em um tubo de ensaio. Retornam para casa.
Pela biopsia identificaram a bactéria que roubou as energias do rapaz franzino tão depressa. Fim da história.
Na medida em que os anos vão passando, um mecanismo de defesa esvazia a memória daquilo que já não importa mais. Episódios, passagens, vivências, além daquele monte de coisas corriqueiras, são apagados sem dó nem piedade. Transformados que são, nos arquivos Temp da memória. Aquele tipo de coisa que já foi usado e que só está ali para ocupar espaço. Só esperando para ser apagado.
Já outras situações, marcadas pelo sentimento, por aquela lembrança boa de se sentir, sinônimos de zelo, união e carinho, estas são guardadas. Retidas para sempre.
A mulher pequena, transformada em muleta viva, para amparar o corpo comprido e abalado do filho, ficou assim na memória. Retida para sempre, mesmo 82 anos depois. Foi assim minha mãe, naquele tempo, ainda me lembro.