Por: Antonio Mata
A estrada de terra batida em terreno meio arenoso deixava antever que a lama não seria um problema. Desde que não se tivesse a ideia de passar por lá com veículos pesados.
Nem por isso, já que veículos, propriamente, não teriam como circular por ali. Não como Silas pensava. Outros, quem sabe. Daqueles que não tocam o chão. Era só uma questão de tempo. Na realidade pouco tempo. Mas, nem disso, Silas sabia.
Lugar aprazível, recanto por entre matas e rios, de cheiro de mato no ar e canto dos pássaros na sinfonia tão conhecida por quem nasceu por bandas do mesmo estilo.
Da lembrança do pé no chão, do cheiro e do banho de chuva. Daquilo que não se esvai nem se perde. Somente fica guardado, como que esperando.
O lugar era assim. Lembrou de uma época, não tão passada, quando se dizia, no meio do mato e esquecido de Deus. Intimamente, achou graça da descrença e confusão que havia.
Só tinha uma coisa. A nítida sensação de se estar em recantos diferentes, particularmente belos. Olhava para tudo e a mata estava lá, o rio, a campina, os pássaros, a terra. Já não era mais uma questão de lugar.
Enquanto caminhava e divagava em pensamentos diversos, foi interrompido pelo simpático casal que o recebera momentos antes. Na realidade, seus anfitriões desde o início.
Querendo se localizar, pensava: “Quando foi mesmo isso? A que horas cheguei aqui?”. Antes que pudesse fazê-lo, teve de atender ao convite do casal.
— O que acha deste lote Silas? É grande o suficiente para abrigar algumas casas, com espaços para jardins e frutíferas. Tudo sem se afastar muito dos bosques e matas ao redor, nem da sinfonia das manhãs. Acho que todos iriam gostar.
A senhora de cabelos muito brancos prosseguiu com os esclarecimentos.
— Também não fica distante das áreas comuns. A ideia é receber a leva inicial de novos moradores. Poderão, inclusive, participar do planejamento de expansão. O que acha? Nos pareceu um bom lugar para uma grande família.
Silas parecia não entender coisa alguma. Ainda arriscava pensar que aquele casal, tão gentil, não sabia com quem estava falando. Teria sido confundido com outra pessoa.
Muito espaço, jardins e frutíferas, planejamento, grande família, aonde? Deduziu que aquilo deveria custar uma pequena fortuna a quem quisesse desfrutar dessa espécie de empreendimento. Fazem tanta coisa hoje em dia.
Imagine só, quando estivesse pronto, com piscinas, quadras, saunas, pista de ciclismo, praças, tudo asfaltado e segurança 24 horas. Decididamente, era muito maior que o bico de Silas.
Olhou para o casal que ria da sua cara. Só que Silas não havia dito nada. Resolveu encerrar a conversa, antes que tivesse que explicar àqueles corretores que haviam encontrado a pessoa errada. Também não tinha dinheiro.
— Agradeço imensamente a oferta e as palavras de vocês. De fato, não tinha em mente comprar coisa alguma. Aliás, perdi o interesse por patrimônios aqui. Minha visão das coisas tem mudado bastante. Realmente, não quero ter propriedades.
O casal ria mais ainda. Mais uma vez, foi a senhora quem falou.
— Você não foi o primeiro. Mas, é só para saber que não estamos lhe vendendo nada. Estamos rindo é da sua resposta. Por estes tempos, você foi o terceiro.
Antes que pudesse dizer que não estava entendendo coisa alguma, deixou aquele lugar e a companhia do casal. Acordou repentinamente, se dando conta de que esteve sonhando.
Imaginava o que aquilo poderia significar. Reunir a família em um mesmo local. Mas, qual família? Não ter de comprar nada, nem pagar coisa alguma.
Um lugar tão bonito, de cores tão vivas. Onde não tem que adquirir nada. Vai entender. Achou melhor pensar nisso em outro dia. Quem sabe descobre a resposta.