Por: Antonio Mata
Melhor não pensar em acaso, já que ele explica tão pouco. Nem acidente, principalmente se for em sequência. Aconteceu e acontece quando chega a hora, quando está maduro.
Tem a confluência, quando o encontro de fatores se define. Às vezes visível, às vezes nem tanto. Apenas se faz. Incontáveis confluências da vida surgem diante das pessoas. Só depois que tudo aconteceu é que se dão conta.
Aquele carro passava por ali porque era ali que tinha de passar. Um caminho corriqueiro e ainda que não fosse não faria a menor diferença. Nem que fosse dentro de casa. Já que a questão não está no lugar, mas aquilo que se quer construir, trazer para o mundo real. Para bem mais perto das energias densas de todos nós.
Desciam a rua sem pressa, observando o movimento e conversando amenidades. Nada em particular, ainda chegariam em casa para verificar algumas coisas que haviam escrito, logo no dia anterior. Mais uma vez, o dia era bom e convidativo.
O carro se deteve por conta de um semáforo. Logo ao lado, alguns trabalhadores buscavam fixar uma extensa peça de madeira. Um deles, com um grande martelo nas mãos, batia sem parar.
Tum, tum, tum, tum...
Aquela batida ficou ali invadindo ruidosamente os ouvidos que esperavam por uma manhã convidativa. O semáforo abriu, quando o carro se pôs em movimento, mais um ruído.
Tam, tam, tam, tam, tam.
Na direção do carro, ele tentava imaginar que diabos era aquilo batendo ali atrás. Parecia vir do porta-malas. Quando freava o troço batia, quando acelerava, batia de novo.
— Era só o que faltava, barulho de dentro e barulho de fora. — Dizia, sem ainda identificar o que batia tanto no do porta-malas. Lembrou que havia deixado ferramentas soltas lá dentro. Mas, por que tanto barulho?
Só para descontrair, Bill, sentado ao lado, começou a brincar com aqueles sons. Do martelo barulhento e do carro sacudindo, do que, nenhum dos dois sabia.
— Tum, tum, tum, tum. Tam, tam, tam, tam, tam. Tum, tum, tum, tum. Tam, tam, tam, tam, tam.
— Até você já ficou perturbado, Bill.
— Relaxa, é já que isso tudo passa.
E passou, menos o barulho no porta malas. Logo teriam de parar mais uma vez. Por uma circunstância difícil de se imaginar. Uma agência de modelos havia concluído cedo um rápido processo de seleção. Só que tinham recebido dezenas de candidatas.
Quando liberaram as meninas, elas saíram de uma vez só. Aí não quiseram saber se havia semáforo ou não. Sinalizavam com as mãos e iam passando por entre os carros. Diante daquele monte de mulheres bonitas, não tinha mais jeito. Todo mundo começou a parar e elas se espalharam pelos dois lados da rua.
Os dois ficaram só assistindo.
— É a geração da Claudete. — Dizia.
— É sim, você é um cara de sorte. Pode acreditar. Pretty woman à direita, pretty woman à esquerda e adiante. Pretty woman em todos os lugares. Descendo a rua, cruzando a rua.
— O que foi que você falou?
— Dessa mulherada bonita? Falei um monte de coisas.
— Não, não, do que estavam fazendo.
— Ah, descendo a rua, cruzando a rua.
— É isso mesmo, isso mesmo. Faz aquele barulho de novo. Aquele que você estava brincando, do martelo e do carro.
— Tum, tum, tum, tum. Tam, tam, tam, tam, tam. Tum, tum, tum, tum. Tam, tam, tam, tam, tam.
A confluência havia se cumprido. Sem acaso, sem acidente, sem “do nada”. Apenas se fez e se cumpriu. Acharam de juntar estes fragmentos, aparentemente díspares, colhidos na rua por onde passavam as mulheres. Daí foram para casa. Todo o resto é a história de um dos maiores sucessos da década de 60.