Por: Antonio Mata
Na sequência interminável dos dias, não haveria nada demais a se mostrar. O comportamento era comum e muito visível. Precisavam agir e viver daquela forma.
Assim viviam, mesmo se acontecesse algo diferente, algo imprevisto. Ofereceriam a mesma resposta de tempos passados. Isto era mais que suficiente para se corrigir as coisas.
Então, fizeram o que já sabiam fazer e isso foi tudo.
A longa fila se estendia por algumas dezenas de metros. O corredor arenoso por entre os arbustos, era pista conhecida. Para a esquerda, uma sequência de lagos menores. Bastaria seguir nesta direção. Para adiante do caminho, chegava-se em um rio.
Descendo o rio, as margens não possuíam praias e sim barrancas. Daí terem preferido ficar onde se encontravam. Contudo, prosseguindo rio abaixo, surgiam novos lagos, porém menores que o grande lago de Azur.
Deu-se que o tempo da fartura de caça e pescado, acabou por ceder a uma época de estiagem muito intensa. O lago do grande Azur, dava mostras de não suportar mais tantas bocas e ter de alimentar a todos.
— Vão, chegou a hora. busquem por água, praias e outros lagos.
Assim foi feito. Adentraram os canais que pudessem conduzir a outros mais adequados. Com boa disponibilidade de informações, na medida em que as equipes retornavam, eram desanimadoras as notícias obtidas.
— No rio não tem água mais não.
— É, não tem não.
— Nos lagos também não. Eu Andei dentro dos lagos, com o leito todo seco.
Azur começou a grunhir e a agitar sua bocarra.
— Tudo eu! Tudo eu! Seus inúteis! Vou até lá, verificar tudo isso, eu mesmo! E vocês, retornem às buscas, para além das barrancas. Antes que eu mate todos vocês!
Azur prosseguiu, descendo o rio e buscando por mais lagos e rios menores que pudessem atender seu grupo. Também nada encontrou. Desiludido, convenceu-se e retornou.
De volta ao grande lago, sossegou em silêncio. Seus temores pareciam se apresentar. Passaram a caçar os últimos e poucos animais que ainda vinham beber na água lamacenta do lago. O pescado já havia acabado.
Sem novos lagos e com a caça acabando, aconteceu o que Azur e os mais antigos já esperavam. Começaram a comer os seus próprios filhotes. Depois os mais jovens e os mais velhos e doentes. Até ficarem somente os adultos.
Ao final, sobreveio uma luta encarniçada entre os mais fortes e capazes, até restarem apenas três, em meio ao lago enlameado. Azur, Cascudo e Selma, a última fêmea do lugar. Ante a continuidade da seca na região, os jacarés estavam a um passo da extinção. A disputa entre Azur e Cascudo foi feroz.
Já cansados de lutar, em um último e repentino esforço, Cascudo conseguiu abocanhar a barriga de Azur. Arrancando as entranhas do adversário, Cascudo põe fim à luta.
Cascudo solta sucessivos urros comemorando a vitória.
— Sou eu! Sou eu! O novo senhor do lago, dos rios e dessas terras! Agora sou eu! O senhor do lago e de tudo!
Levantou a cabeçorra e olhou ao redor. Em seus vastos domínios só havia lama e carcaças de corpos esfacelados. Além de rios, lagos menores e igarapés completamente secos. Logo adiante, aguardando pelo esfomeado e enlouquecido vencedor. O novo senhor do lago, estava Selma.