Por: Antonio Mata.
O pátio extenso e limpo, circundado por baixa murada em pedra, deixava ver os espaços ao redor. De um lado, o campo de vento suave, mas que empurrava a relva e uns poucos arbustos.
Do outro lado o pequeno e frondoso bosque, em desenho geométrico, dava mostras de antigo e conservado trabalho humano. O lugar por si só, tinha seu lado de acolhedor.
À frente a construção em madeira e pedras combinados, não lembrava uma moradia e sim uma espécie de estábulo. Contudo, não foi isso o que mais prendeu sua atenção.
Sem mais nem por quê, se viu em um estranho capuz que cobria sua cabeça até abaixo dos ombros. Só aquilo já foi o suficiente para o desconforto e indagações. Não pela peça em si, mas pelo significado que comumente ela encerra. Não gostou da ideia e ficou apreensivo.
Ninguém cobre o rosto sem uma razão. Este, sim, era o motivo. Incomodou-se mais uma vez. Agora por estar ali metido em tais coisas, tão estapafúrdias. Frustrado e desorientado, baixou a cabeça. Como veria logo a seguir, nem era só isso.
Bastou erguer a cabeça e viu mais pessoas reunidas em grande círculo, o qual possuía uma abertura na altura do prédio, bem em frente. Nas cabeças o tal do capuz, só que em cores diferentes.
Quanto mais pensava, menos entendia. Aqueles capuzes coloridos ali, não faziam nenhum sentido. Não verem seu rosto a troco de quê? E os demais?
Eram tons pastéis nos capuzes, cores claras. Se antes já parecia coisa sem nexo, imagina agora, pensou. Mais de vinte pessoas com certeza, mas estava confuso demais para querer contar algo.
O que surgiu logo a seguir, lhe deixou apreensivo de novo. Buscou se acalmar. Atitude natural adquirida no passar dos anos. Compreendia que nem tudo lhe era acessível saber. Entrou em oração, por hábito.
O que viu foi enorme zebu com pelo menos dois metros e meio de altura no cupim. Aquela sua corcova. Os chifres avantajados e outra coisa que muito o impressionou. A cor de castanha escura do bicho, puxando e muito para o vermelho, na cabeça e nas partes elevadas do corpo.
Havia algo de belo naquele bicho enorme. Porém, não era tolo e sabia de antemão que não é a forma física que determina o conteúdo. Não deixou de notar o ar sinistro no olhar e a estranha vibração que partia daquela besta. Não, não se tratava de um zebu qualquer. Aquilo ali, visível, era o seu capuz.
Sustentou a mente sã e se preparou para o que pudesse vir.
A criatura que se apresentava como enorme animal aproximou-se. Um por um cheirou a todos. A cabeça, o pescoço, passando pelo peito e braços até pés. Para uns, era rápido, para outros acabava sendo uma inspeção mais demorada.
Depois fitava os olhos de cada um sem lhes retirar o capuz. Quando então se afastava, retornando ao centro do círculo. Ficava em silêncio e imóvel.
Repentinamente, virou-se para um dos encapuzados fitando o mesmo demoradamente. Se aquele animal achasse de atacar alguém, o escolhido acabaria estirado por sobre a mureta. Como um boneco de pano.
Em silêncio retornou ao centro do círculo. Tornou a virar-se oferecendo nova observação demoradamente. Mais uma vez, se houvesse um ataque, seria o fim.
Incólume, apenas aguardava o desenlace daquela situação. Seria atirado ao ar, ou não seria? Preferiu afastar tal pensamento de sua mente. Aquele espetáculo medonho estava se tornando sanguinolento. Só queria que acabasse.
Em dado momento, se deu conta que a maioria dos presentes já havia passado naquele exame estranho. Mas, ainda faltava ele. Ficaria sendo cheirado e sob observação mais uma vez?
Foi quando o animal, ou quem quer que se apresentasse como tal, berrou chamando a atenção de todos e depois falou.
— Já separei o que me pertence. Aqueles que vou levar. Aqueles que só parecem, mas não são. Os demais, não quero mais vê-los, sumam todos daqui.
Estava livre, se deu conta de que estava livre. Não seria mais cheirado ou chifrado. Muito menos terias aqueles olhos estranhos na sua frente mais uma vez.
Contudo, alguns dos presentes ficaram retidos em seus lugares, sem poder se mover. Sem que pudesse identificá-los.
Abriu-se uma passagem na mureta e os demais puderam sair dali sem maior perturbação. A provação havia encerrado.
Um sentimento de alívio tomou conta de sua mente. Pela primeira vez se sentia tranquilo. Lamentou consigo mesmo, pensando nos que ficaram para trás, mas sabia que não havia o que fazer. Não ali e assim, tão cedo.
“Muitos serão os chamados, poucos os escolhidos”.